terça-feira, 28 de junho de 2011

O DIREITO DE CONHECER A NORMA CULTA

Recentemente no Brasil foi suspensa pelo Governo a distribuição do livro  “Por Uma Vida Melhor”, a 500.000 estudantes do ensino fundamental, tratando sobre uma velha discussão da teoria sociolingüística, linguagem popular versus linguagem culta como meio de comunicação.

Defensores do livro alegam que a imprensa irresponsável e desinformada alimenta uma visão reduzida sobre o ensino da língua e ofende todo o trabalho desenvolvido pelos lingüistas e educadores de nosso país, cujo objetivo apenas seria desmistificar a noção falar “errado”, substituindo-a pela de adequado/inadequado. Isto fundamentado no pressuposto de que não se deve admitir a superioridade de uma expressão cultural sobre outra. No entanto não apenas a imprensa dita desinformada, mas também a Academia Brasileira de Letras, em especial seu principal interlocutor, o gramático Evanildo Bechara, considera que alguns colegas subvertem a lógica em nome da doutrina e que a defesa do livro decorre de um equívoco, confundindo a discussão sociolingüística, que deveria se limitar ao meio acadêmico, como problema de ordem pedagógica.

Na página 12 do livro consta: “Como a linguagem possibilita acesso a muitas situações sociais, a escola deve se preocupar em apresentar a norma culta aos estudantes, para que eles tenham mais uma variedade à sua disposição, a fim de empregá-la quando for necessário”. Enquanto defensores do livro alegam preconceito lingüístico, como forma de domínio da elite social, e a desconsideração do caráter multifacetado e plural do português brasileiro. O movimento contrário rebate que justamente o ensino da norma culta ajuda na libertação dos menos favorecidos, e que o livro é fruto de resquícios ideológicos de um movimento que surgiu no meio acadêmico na década de 60, quando se contestava qualquer tipo de norma ou autoridade.

Lendo sobre as posições defendidas e alguns dos trechos do livro (consegui na net), na condição de leigo arrisco dizer que será criada uma distância muito maior entre  o ensino da rede pública e o ensino da rede privada. Porque os “Colégios São Bento da vida” continuarão ensinando a língua culta, enquanto as crianças da rede pública aprenderão que escrever “Nós joga as pedra” também é possível, mas que poderão sofrer preconceito lingüístico. Será que estas crianças escolherão aprender algo mais difícil, se escrever assim não está errado? Eu me pergunto também se os defensores deste livro pagariam para seus filhos aprenderem língua inglesa que não seja dentro da linguagem culta. Imagino que estrangeiros usarão melhor o português em linguagem culta do que a maioria dos brasileiros.
             Vejo que em longo prazo teremos mais uma secção em nossa sociedade. Pode parecer paranóico, mas sinto que caminhamos para um futuro em que as diferenças estarão cada vez mais realçadas, estrategicamente plantadas por causas ideológicas. Inicialmente foram realçadas as diferenças que já existiam, algumas eram discretas. No futuro teremos uma elite com linguagem culta, cada vez mais dominadora sobre uma massa com linguagem cada vez mais pobre. Logo será crime também o preconceito lingüístico. A quem interessa uma sociedade tão fragmentada e cheia de conflitos?

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